Nunca encontrei ninguém completamente incapaz de aprender a desenhar.

John Ruskin, intelectual inglês do século XIX


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terça-feira, 30 de outubro de 2012

Cais do Gás


Quando tinha 14 anos fazia vela no CNL ao fim das tardes de terça e quinta feira.
As instalações eram no Cais do Gás.
Descíamos e subíamos os snipes pelo perret no meio de fragatas, varinos, canoas e faluas e da população correspondente. Havia por ali muita pesca miúda e mesmo alguns pesqueiros do alto e cargueiros eram por ali descarregados. Aquilo fervilhava de barcos e de gente.
No Inverno, com os dias curtos, só havia vela aos fins de semana, mas no Outono e Primavera já era frio e não havia anoraks nem botas. Apenas umas camisolas de lã, camisas de flanela e alpergatas de corda que ficavam pesadíssimas e saíam dos pés quando chegavam à água.
Tenho saudades dessa vida mas nem tudo era azul. Grande parte dos navios usavam nafta que empestava todo o rio com flocos nojentos que sujavam tudo e ficavam à espera, nas praias e nos cais, para se colarem aos pés.
Havia um cargueiro de cabotagem (na época até se fazia cabotagem) que tinha uma máquina a vapor cuja caldeira fora convertida a nafta.
Neste Verão voltei a passar por lá.
Está um sítio lindo. Sem nafta, com uma água relativamente limpa, sem aqueles cheiros do alcatrão, óleo e peixe... (que saudades)
O perret por onde descíamos os barcos está agora coberto com um maravilhoso deck onde tomámos um aperitivo vendo a água por baixo dos nossos pés. Há uma música ambiente e um serviço cuidado.
Não há barco nenhum. Mesmo na outra banda, o Ginjal está despido, fantasma, sem ninguém. Nem os snipes, nem as fragatas nem os varinos nem as canoas. Nem mesmo os cargueiros ou bacalhoeiros que paravam na outra banda.
Moram todos na minha memória.
Foi um fim de tarde mágico.
Havemos de lá voltar.

6 comentários:

hfm disse...

Texto e desenho encantatórios. Obrigada por partilhar não só os desenhos mas também as memórias.

Filipe LF disse...

E há melhor maneira de recordar do que desenhando os cenários das nossas vidas?
Tenho pena de não ter conhecido o Tejo fervilhante de barcos desse tempo;abençoado privilégio conhecer quem tenha assistido e esteja disposto a partilhar tão "graficamente" essas memórias!

Maria Celeste disse...

...um desenho carregado de memórias sensoriais...
...foi bom ter partilhado...

Mário Linhares disse...

Lindo!

Rosário disse...

Belas memórias!

zeta disse...

Uma faceta com muitos pormenores desconhecidos mas com notável interesse gráfico e informativo.